Além de inaugurar uma nova relação entre patrões e empregados, e-Social vai eliminar dez declarações e substituir o documento tradicional dos trabalhadores
SÃO PAULO - Substituir a Carteira de Trabalho em papel por
um cartão eletrônico, reduzir a burocracia e conferir mais transparência
às informações trabalhistas. Este é o objetivo do e-Social anunciado
pelo governo.
Previsto desde 2009, o e-Social vem tropeçando nos prazos de início e
sofrendo adaptações. É um dos módulos do intrincado Sistema Público de
Escrituração Digital (Sped). Vai reunir em único envio eletrônico
informações relacionadas à Receita Federal, Ministério do Trabalho e
Emprego (MTE), Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), Ministério da
Previdência Social (MPS) e Caixa Econômica Federal (CEF).
Apelidado de "Big Brother", pois permitirá acesso on-line a toda e
qualquer movimentação na folha de pagamento das empresas, o sistema tem
defensores e detratores. "A vantagem é que, se funcionar a contento,
todas as informações estarão acessíveis imediatamente para o empregador,
o empregado e os órgãos governamentais. Mas unificar o cadastro talvez
não seja tão simples. Foram gastos R$ 6 milhões para desenvolver o
sistema e vimos, neste primeiro momento, que não conseguiu atender à
demanda", diz o empresário contábil Maurício Tadeu de Luca Gonçalves,
diretor-executivo da Partwork Associados e diretor do Sindicato das
Empresas de Serviços Contábeis (Sescon-SP), em referência aos problemas
apresentados pelo e-Social doméstico.
"Vamos acabar com mais de dez declarações. Algumas, como Caged, Rais,
Dirf, Sefip e Gfip, serão eliminadas instantaneamente. E a instituição
do canal único de envio de informações trabalhistas vai reduzir a
burocracia tributária", defende o auditor fiscal Samuel Kruger, gerente
do Projeto e-Social da Receita Federal, em palestra ministrada na Câmara
Brasileira de Comércio Brasil-Estados Unidos.
O e-Social será obrigatório a partir de setembro de 2016 para
empreendimentos com faturamento superior a R$ 78 milhões. Isso
representa aproximadamente 5% das empresas brasileiras. Em janeiro de
2017, passa a valer para todas as demais, de qualquer tamanho. Aí será a
prova de fogo, pois entrarão as pequenas e médias, grande força
empregadora do País.
Uma das maiores dificuldades previstas por especialistas é em relação
à adaptação do sistema às regras trabalhistas vigentes. "A CLT
[Consolidação das Leis do Trabalho] é da década de 1940. Como vamos
lidar com elementos novos como banco de horas e tarefas executadas em
home office, por exemplo?", questiona Maurício Gonçalves.
"Estamos trabalhando em um sistema para interligar nosso banco de
dados aos dos clientes e dessa maneira tornar a troca de informações
mais rápida e eficiente", relata Gláucia Fernandes, coordenadora
trabalhista da Datanil, empresa especializada em consultoria contábil,
tributária e trabalhista. Ela conta que terá de contratar mais
funcionários para concluir essa tarefa. "É preciso um esforço de
planejamento, pois grande parte das empresas, sejam pequenas, médias ou
grandes, não mantém a escrituração como deveria."
Há quem esteja preparado e tranquilo. É o caso de Luzia Costa,
proprietária da rede de franquias Sóbrancelhas, que viu seu negócio,
aberto em 2013, se tornar um sucesso, com expectativa de chegar ao final
de 2015 com faturamento de R$ 24 milhões. "Sempre fiz todas as
escriturações de maneira minuciosa, sou muito atenta aos direitos
trabalhistas dos meus funcionários e acredito que não vá ter problemas
na transição, porque nossos cadastros estão todos 100% em ordem",
afirma. "Já vi muita gente quebrando em razão de processos trabalhistas.
Por isso, se não puder pagar tudo direitinho, nem contrato."
Em dois anos de operação, a marca abriu 102 unidades, gerando 450
empregos, de acordo com Luzia. Além de atender 65 mil clientes por mês
que vão em busca de tratamentos estéticos, vende uma linha de 18
produtos de beleza. "Entendo que a intenção do governo com essa operação
é aumentar a arrecadação. Mas sei também que muitos empresários
desrespeitam as leis trabalhistas, e quem sai perdendo é o empregado.
Então, vamos nos adaptando. Fácil não é. Mas conseguimos crescer, mesmo
pagando uma montanha de impostos", conclui.
Já Fred Rocha, empresário e consultor de varejo, hoje com apenas dois
funcionários em seu estabelecimento, prefere deixar para depois a
preocupação com a burocracia que virá, mas vai demorar um pouco, já que
sua empresa só entrará no e-Social em janeiro de 2017. "Embora eu seja
economista de formação, minha preocupação agora é estudar o mercado e
descobrir soluções do balcão para a frente. Do balcão para trás eu deixo
para os contadores cuidarem", argumenta.
By Lúcia Helena de Camargo
Fonte: DCI
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